Por Leandro Karnal
LK: (...) O grande problema atual é ter encarnado a partir de um discurso americano de que sucesso e fracasso - ser *winner* ou *loser*, perdedor ou vencedor - se deve exclusivamente à capacidade e ao esforço. Logo, conclusão indireta e perversa dessa ideia, é a de que os pobres são pobres por querem e os ricos são ricos porque tem mérito. Este talvez seja o pensamento mais perverso que se possa ter a este respeito.
Jeff Cassiano: Essa é a ideia da meritocracia. E se a gente pensar na meritocracia num país como o Brasil, com as injustiças todas, históricas inclusive, é meio complicado. Não é que inviabilize a meritocracia, mas não é uma regra que vale para todos os casos.
LK: Ou pelo menos essa internalização, ou seja, fazer o indivíduo se achar culpado por tudo. Porque há cinquenta anos, por influência de um pensamento crítico, talvez ligado à esquerda, se dizia que era o sistema que impedia alguém de ser bom ou de ser vitorioso. Hoje se diz que é o indivíduo.
Todas as frases afirmativas da autoajuda estão ligadas ao empreendedorismo. Por exemplo, "o que você pensar, acontece". Imaginar que o que você pensa acontece só ocorre com duas categorias de pessoas: as crianças e os esquizofrênicos. São as categorias que acham que o discurso cria.
Ora, atire-se de um prédio, e pense se você pode voar. E pense firme, pense muito positivamente. E você vai descobrir que Newton é mais forte que o seu pensamento, e você está sendo atraído à Terra independente do pensamento positivo ou negativo. E nem sempre o positivo deve ser aguardado com ansiedade. Quando você faz um exame de gravidez ou de HIV, positivo talvez seja a palavra que você não quer ver registrado. A ideia de que o sucesso pertence a quem tem pensamento positivo é uma ideia infantil. O sucesso pertence a uma pessoa por uma série complexa de ações, de determinações sociais, de oportunidade, de inteligência, de sorte, de acidente, de herança, de acaso... é uma complexidade enorme para dizer que o pensamento cria. Quem acredita disso, "eu fecho os olhos e imagino que vou ganhar algo no Natal" é exatamente a criança ou o esquizofrênico, que tendem a confundir realidade com fantasia.
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