Uma das professoras ainda registrou boletim de ocorrência em que relata ter sido perseguida por ele no campus. A guarda universitária forneceu um botão de pânico para que as vítimas utilizassem no local. Uma das docentes passou a ser escoltada nos trajetos entre sua sala e o laboratório no qual ministrava disciplina.
Distribuídos em 2019, os bilhetes continham ofensas com trocadilhos relacionados às vítimas. Um deles, por exemplo, dizia "Hiscória da ciência! Você é lixo", e tinha como alvo a única docente da área de história da ciência no instituto. Outro fazia trocadilho com sobrenome de uma professora por meio dos dizeres "putarias e banda podre".
No verso de um deles estava um formulário de parecer sobre realização de doutorado em universidade do exterior, de caráter sigiloso, preenchido com o nome do parecerista —no caso, Gorab.
As denúncias e o material contra Eduardo Gorab foram analisados por uma comissão processante, cujas conclusões foram acolhidas pelo reitor da USP, Vahan Agopyan, que decidiu pela demissão diante da "gravidade das condutas do processado".
O nome de Gorab já não consta mais na seção de docentes do site do Instituto de Biociências.
Cabe recurso à decisão, e Gorab diz ao Painel que o fez, e portanto ainda não se considera demitido. Ele não quis falar do caso. À polícia ele disse que sofre de "apagões de memória", que iniciou tratamento psiquiátrico em 2015 e que estava arrependido.
Ele anexou ao processo um laudo médico que faz afirmações no mesmo sentido: houve troca em sua medicação em 2019 e 2020, época em que ele se queixou de lapsos de memória, que teriam acabado após a estabilização dos remédios em seu organismo.
O histórico do professor pesou negativamente na avaliação do caso mais recente. A aluna referida em bilhete como "pósputa.doc", atualmente no pós-doutorado (a única no laboratório em que foi encontrada a carta), já havia apresentado denúncia por assédio moral em 2015 contra Gorab.
Na mesma época, uma estudante fez boletim de ocorrência e abriu processo administrativo contra Gorab por assédio sexual. Ela foi alvo de um dos bilhetes de 2019: no caso, uma associação de seu nome a “mau caráter” e “vagabunda".
Uma funcionária do laboratório também encontrou em setembro de 2019 sete bilhetes idênticos com referência ao ocorrido em 2015 com injúrias como "vagabunda", "canalha" e "tipinho criminoso".
Sobre essas denúncias anteriores, uma comissão processante concluiu em 2016 que Gorab havia agido inadequadamente, destratando alunos e colegas, mas que não existiam "evidências contundentes e irrefutáveis" que caracterizassem claramente assédio sexual.
Uma das professoras ofendidas pelos bilhetes foi testemunha de uma aluna na sindicância, que resultou em uma suspensão para Gorab.
Na Justiça, as professoras chegaram a acordo a respeito das injúrias, e Gorab não poderá se comunicar com elas de qualquer forma (email, telefone, etc.), deverá manter distância delas e enviar relatórios de acompanhamento psiquiátrico trimestralmente ao tribunal.
O coletivo feminista Trepadeiras, de estudantes da Biologia da USP, publicou relato atribuído a uma professora anônima que afirma que o processo de demissão de Gorab foi muito longo e custoso para as vítimas.
“Hoje é um dia de celebração de um marco histórico. Pelo menos, nunca vi acontecer em uma universidade grande do país”, diz o texto.
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