7 de jul. de 2016

Como experimentar Deus hoje

16 de junho de 2016, por Leonardo Boff

Apesar desta busca incansável, todos testemunham: "ninguém jamais viu Deus" (1 Jo 4,12). Moisés suplicou ver a glória de Deus. Mas Deus lhe disse: "Não poderás ver a minha face porque ninguém me pode ver e permanecer vivo(Ex 33, 20). Se não podemos vê-lo, poderemos identificar sinais de sua presença. Basta prestar atenção e abrirmo-nos à sensibilidade do coração


Nos dias atuais vivemos tempos tão atribulados politicamente que acabamos psicologicamente alterados. O não ver caminhos, andar às cegas, ao léu como um barco sem leme, nos tira o brilho da vida. Acabamos esquecendo das coisas essenciais.

É então que nos voltamos para aquela Fonte que sempre alimentou a humanidade, especialmente em tempos sombrios de crise generalizada. Sentimos saudades de Deus. E queremos experimentá-lo e senti-lo a partir do coração.

Se olharmos a história, constatamos que a humanidade sempre se perguntou pela Última Realidade. Dava-se conta de que não podia saciar sua sede infinita sem encontrar um objeto Infinito adequado à sua sede. Nem conseguiria explicar a grandeza do universo e a nossa própria existência sem apelar para aquilo que se convencionou chamar de Deus, embora tenha mil outros nomes conforme as diferentes culturas. Hoje, numa linguagem secular, vinda da nova cosmologia, falamos da “Fonte Originária de onde vem todos os seres”.

Apesar desta busca incansável, todos testemunham: "ninguém jamais viu Deus" (1 Jo 4,12). Moisés suplicou ver a glória de Deus. Mas Deus lhe disse: "Não poderás ver a minha face porque ninguém me pode ver e permanecer vivo" (Ex 33, 20). Se não podemos vê-lo, poderemos identificar sinais de sua presença. Basta prestar atenção e abrirmo-nos à sensibilidade do coração.

Impressiona o testemunho de um indígena norte-americano Cherokee que conta de alguém que buscava desesperadamente Deus mas que não prestava atenção à sua presença em tantos sinais. Ele conta:

“Um homem sussurou: Deus, fale comigo! E um rouxinol começou a trinar. Mas o homem não prestou atenção. Voltou a perguntar: Deus, fale comigo! E um trovão reboou pelo espaço. Mas o homem não deu importância. Perguntou novamente: Deus , deixa-me vê-lo! E uma enorme lua brilhou no céu profundo. Mas o homem nem reparou. E, nervoso, começou a gritar: Deus, mostra-me um milagre! E eis que uma criança nasceu. Mas o homem não se debruçou sobre ela para admirar o milagre da vida. Desesperado, voltou a gritar: Deus, se você existe, me toque e me deixa sentir a sua presença, aqui e agora. E uma borboleta pousou, suavemente, em seu ombro. Mas ele, irritado, a afastou com a mão”.

“Desiludido e entre lágrimas, continuou seu caminho. Vagueando sem rumo. Sem nada mais perguntar. Só e cheio de medo. Porque não soube ler os sinais da presença de Deus”.

A consequência dessa desatenção, produziu desespero, solidão e a perda de enraizamento. O oposto à crença em Deus não é o ateísmo. Mas a sensação de solidão e de desamparo existencial. Com Deus tudo se transfigura e se enche de sentido.

Para termos uma verdadeira experiência de Deus precisamos ir além da razão racional que compreende os fenômenos pela rama, calcula-os, manipula-os e insere-os no jogo dos saberes da objetividade científica e também dos interesses humanos. Esse espírito de cálculo pensa sobre Deus mas não percebe Deus.

Precisamos de outro espírito, aquele que sente Deus: o espírito de finura e de cordialidade, de encantamento e de veneração. É a razão cordial ou sensível. Ela sente Deus a partir do coração.

Deus é mais para ser sentido a partir da inteligência cordial do que para ser pensado a partir da razão intelectual. Então nos damos conta de que nunca estávamos sós. Uma Presença inefável, misteriosa e amorosa nos acompanhava.

Não será por isso que nunca acabamos de perguntar por Deus, século após século? Não será por isso que sempre arde o nosso coração quando nos entretemos com Ele? Não seria o advento d’Ele, do sem Nome e do Mistério que nos habita?

Estamos seguros que é Ele, quando não sentimos mais medo porque estamos na palma de sua mão. Então experimentamos discreta serenidade e irradiamos vida e bondade.


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